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Weiter Schreiben Mondial - Briefe > Cíntia Goncalves & Mariam Meetra > Gegenwart ist der einzige Ort, an dem Veränderung möglich ist – Brief 1

O presente é único lugar onde a mudança é possível. - Carta 1

Übersetzung: Michael Kegler aus dem angolanischen Portugiesisch

Cíntia Goncalves
© Privat

O tempo é a única fronteira intransponível que conheço:
O passado foi há dois minutos, mas não podemos lá voltar. O futuro é logo a frente, mas é um lugar proibido. O presente é único lugar onde a mudança é possível.

Querida, Mariam
Espero que esta carta lhe encontre de boa disposição e, acima de tudo, feliz.
Antes de tudo preciso dizer que vivo um momento de grandes mudanças nas minhas concepções sobre “Fronteira e Liberdade”.
A escrita é o lugar onde posso libertar a mulher que habita em mim e com ela liberar o caos, trazer à tona as verdades cruéis varridas para debaixo do tapete e acabar com esse silêncio que fere os ouvidos de qualquer um que tenha coração.
A escrita é o lugar onde me sinto enorme, um corpo volumoso e potente, grávido de pensamentos proibidos que, cada vez que tenho a tinta da caneta a escorrer pelo papel, vêm a luz. A minha maior liberdade é poder escrever sobre o que incomoda, é assim que me sinto livre dos grilhões da falsa moral e da hipocrisia da sociedade.
Minha cara, viajo de carro pelo interior do meu país e há muito que lhe conte sobre as nossas fronteiras e limites. Angola faz fronteira com três países, mas vou falar sobre os nossos limites internos que, além de separarem o território nacional, separam as pessoas e as oportunidades. A fronteira mais difícil para quem trabalha com a escrita é o elevado número de pessoas iletradas. Escrevo para um país que não sabe ler. Não lê os seus escritores, não lê a sua verdadeira história, não lê a sua gente, não lê o seu futuro.
Outra fronteira surpreendente é a da língua; embora o português seja a língua oficial, Angola tem cerca de 10 línguas locais, com variações de região para região. A informação é quase toda difundida em português, o que implica que boa parte do meu povo vive além da sua realidade. Pois a informação não chega ao interior do país.
Há dois anos tenho trabalhado para um programa da União Europeia em Angola, destinado para as províncias do sul de Angola que são fortemente afectadas pela seca. Desde então, passo muito tempo fora da minha cidade, Luanda, longe do meu berço. Longe desta capital maquiada de prédios e construções imponentes que escondem a vergonha de anos de um governo violento e corrupto. Um governo que em mais de 40 anos mergulhou a minha pátria em um tremendo atraso. Que roubou as oportunidades de desenvolvimento de um povo e covardemente vai dando migalhas como se fosse possível doar ao povo o que por direito lhe pertence.
Querida Mariam, desculpe apresentar-lhe essa realidade tão atroz logo na primeira carta, pois tenho vivido momentos difíceis. Quase todos os dias vou descobrindo a mim e ao meu país, um país além dos muros da capital, dos cartões postais e imagens da internet. Um país que anda roto, passa fome e perde a esperança cada vez que crianças menores de 5 anos morrem de desnutrição crónica. Um país onde a fome e a pobreza têm rostos de mulheres e crianças. Mas é também um país de milionários e grandes escândalos financeiros. Uns têm tanto e outros tão pouco.
As fronteiras tornam essa dura realidade longe. Quando passa na TV parece que é tudo muito distante, que não nos afecta, que não é o nosso povo a sofrer amargamente.
No entanto, apesar de tudo isso, ainda conseguimos sorrir e dançar. Cantar as nossas dores e celebrar o alimento que a terra nos dá. Pois, apesar de tudo, somos um povo resiliente.
Deixo para si um poema, fotografias e vídeos de uma visita que fiz a uma cooperativa de mulheres agricultoras, na província do Cunene, município de Ombadja, comuna do Xangongo.
Antes do programa, essas mulheres caminhavam durante 3 horas à procura de água potável. A agricultura familiar, principal meio de subsistência, era quase impossível por causa da seca. A comunidade ficou quase vazia, as pessoas morriam de fome, o gado morreu todo e os que restaram mudaram-se para as comunidades mais próximas, onde a realidade não é tão diferente. Actualmente, conseguimos implementar furos de água, sistema de irrigação, a natureza nos ouviu e tem chovido mais. E então elas celebram, e eu celebro com elas.
Um abraço dessa terra quente. E até breve. Espero que goste do texto que deixo para si, dos vídeos e das imagens.
Atenciosamente,
Às Mulheres do Cunene
Ao pé do rio Cunene, entre o verde vibrante da natureza e a terra vasta bem trabalhada, prolongam-se cânticos de emoção. O sibilar das mulheres do Môngua emudeceu os pássaros. No meu rosto, apenas o espanto se faz notar, minha força é agora ser frágil.
Há um cordão que conecta mulheres de todos os lugares, se estendermos as mãos poderemos amparar cada árvore tombada, salvá-las do mundo em chamas. No Môngua cantamos e vibramos juntas, celebramos o “Ser Mulher”, há tanto que vos conte! Para lá do tempo nossa uníssona música ecoa sonho afora.
No Cunene, como em qualquer lado, mulheres extraem a água da vida para matar a sede do mundo.

P.S.: As músicas no vídeo são cantadas em uma língua angolana: o Nhaneka-humbe.

Tradução do cântico:
“A chuva caiu na terra
Os agricultores estão felizes
Gostaríamos que nos dessem enxadas
e catanas para podermos trabalhar ainda mais”

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